Realizou-se hoje a terceira reunião, com a presença do Secretário de Estado da Administração Pública, sobre o regime legal, em vigor, do teletrabalho.
O STE apresentou ao Governo os seus contributos, que anexamos.
Terminado este ciclo de reuniões, a área da Administração Pública irá agora reunir com a área do Trabalho e Segurança Social para preparar uma proposta de alteração legislativa aplicável a todos os trabalhadores, quer da Administração Pública quer do sector privado, que se espera para breve.
A Direção
TELETRABALHO
A PROPOSTA DO STE ENTREGUE HOJE AO GOVERNO
1. A evolução das tecnologias de informação e comunicação, da forma de viver e de produzir, trouxe, como não podia deixar de ser, impactos relevantes sobre a forma, condições e organização do trabalho implicando novos modos de produzir e de pensar a organização do trabalho.
Os serviços públicos, para dar resposta aos cidadãos e às empresas têm que se adaptar, modernizando o seu funcionamento, recrutando trabalhadores cada vez mais qualificados, proporcionando melhores condições de trabalho e melhores remunerações de forma a reter os melhores na Administração Pública.
Esta é uma tarefa que não se fará num abrir e fechar de olhos, nem sem um planeamento do que tem e deve ser feito.
“A Covid-19 acelerou a tendência para a transição digital, obrigou as empresas, os trabalhadores, as instituições, o Estado e o Governo a reinventarem os seus modelos e sistemas de trabalho, recorrendo muito mais ao teletrabalho.“ [1]
[1] In, Visão Estratégica para o Plano de Recuperação Económica de Portugal 2020-2030, pág. 7
2. Não podemos ignorar que a questão do teletrabalho na Administração Pública é já antiga. De facto, o Decreto-Lei n.º 259/98, de 18.08, que estabelecia as regras e os princípios gerais em matéria de duração e horário de trabalho na Administração Pública, conforme referido no preâmbulo considerava já que: “…a criação do regime de prestação de trabalho sujeito apenas ao cumprimento de objetivos, situação que facilita a concretização do designado «teletrabalho ..»” (art. 23.º).
A necessidade de recorrer ao teletrabalho foi, também, uma preocupação de vários governos. A título meramente exemplificativo em 2005, o XVII Governo Constitucional (José Sócrates) prevê no programa de Governo a necessidade de modernização da Administração Pública, nomeadamente por recurso ao teletrabalho.
O teletrabalho foi, também, consagrado na cláusula 15.ª do ACT N.º 1/2009 primeiro Acordo Coletivo de Trabalho para a Administração Pública, que o STE celebrou.
A concretização do teletrabalho nos moldes em que o conhecemos foi consagrada nos arts. 194.º e ss da Lei n.º 59/2008, 11.09, (Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas), revogada pela Lei 35/2014, de 20 de junho, que remeteu a aplicação do Teletrabalho para o Código do Trabalho.
Não obstante esta consagração legal, com exceção deste período de pandemia, o recurso ao teletrabalho foi pouco expressivo na Administração Pública,
Chamados a refletir sobre a necessidade de alterar/densificar o regime do teletrabalho, após ouvir os trabalhadores da Administração Pública para apurar o que seria importante que estivesse regulado, o STE concluiu que:
a) É necessário definir um quadro legal que regulamente de modo mais detalhado o teletrabalho e proteja os trabalhadores, idêntico para os trabalhadores públicos e privados. Deverá aplicar-se a todas as administrações (central, local e regional) e a todas as carreiras.
b) O teletrabalho deve acontecer sempre por iniciativa do trabalhador e nunca pode ser imposto unilateralmente pelo empregador.
c) O teletrabalho deve corresponder a uma forma de prestação de trabalho subordinada, e por isso sempre dependente da existência de um contrato de trabalho por tempo indeterminado.
d) Deverá manter-se, de forma inequívoca, a possibilidade de reversibilidade.
e) Devem ser alargadas as situações em que o teletrabalho não pode ser recusado pelo empregador, nomeadamente:
i) Trabalhadores com deficiência, com grau de incapacidade igual ou superior a 60 %;
ii) Trabalhadores com filho menor de 12 anos;
iii) Trabalhadores com ascendente(s) a cargo, com especial enfoque para os cuidadores informais;
iv) O trabalhador que, mediante certificação médica, se encontre abrangido pelo regime excecional de proteção de imunodeprimidos e doentes crónicos, nos termos do artigo 25.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 10 de março, na sua redação atual;
v) desemprego de um dos elementos do agregado familiar (tendo em vista a redução dos custos do agregado familiar).
f) Deverá admitir-se a possibilidade de ser total ou parcial.
g) O teletrabalho está sujeito aos limites máximos do período normal de trabalho diário e semanal aplicáveis aos restantes trabalhadores.
h) Direito à fixação de um horário de trabalho, de entre as modalidades identificadas na Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas. Qualquer comunicação com o trabalhador deve ser feita no período normal de trabalho.
i) As reuniões ou teleconferências devem ser previamente agendadas, para salvaguarda da privacidade do trabalhador e da sua família;
j) Todas as ferramentas de trabalho devem ser fornecidas pela entidade empregadora, assegurando a sua manutenção, o que inclui:
i) Computador (portáteis);
ii) Hardware específico ou associado a subscrição de telecomunicações;
iii) Terminais telefónicos (fixos ou móveis);
iv) Software necessário, designadamente antivírus;
v) Impressora e consumíveis se necessário.
k) Para prevenir os riscos psicossociais que estão associados ao regime de teletrabalho como o isolamento social e profissional, deficientes condições do espaço onde são executadas as funções, as dificuldades que podem ocorrer com a gestão do tempo e a separação entre tempo de trabalho e tempo para a família, (nomeadamente quando a atividade é exercida no espaço da família), a atribuição de objetivos sobredimensionados, com o controlo desajustado feito pelo dirigente direto quer por excesso quer por defeito, determinar-se que o empregador deve promover a realização de exames de saúde periódicos, tendo em vista verificar a aptidão física e psíquica do trabalhador para o exercício da atividade, bem como a repercussão desta e das condições em que é prestada na saúde do mesmo.
l) Embora esteja já previsto no regime atual é essencial que se garanta de forma efetiva que os trabalhadores em regime de teletrabalho gozam dos mesmos direitos dos restantes trabalhadores em regime presencial (nomeadamente, acidentes de trabalho, formação, e de representação sindical).
Concluindo:
O Teletrabalho não é panaceia para todas as coisas e crises, tão pouco é para a conciliação entre a vida familiar e o trabalho.
O Teletrabalho é uma forma de organização do trabalho, e deve ser visto como uma opção individual na forma de prestação do trabalho. Nunca pode ser imposta ao trabalhador como aqui ou ali parece querer-se.
Por fim é também altura de equacionarmos, face à digitalização dos processos de trabalho e de produção na redução do tempo de trabalho, garantindo, talvez, trabalho para todos.